domingo, 12 de julho de 2009

Quando me beijas




























E o meu amado perguntou:
- Quando me beijas
fechas os olhos ou deixa-os abertos?
- Depende, respondi.
Quando me beijas durante o dia,
fecho os olhos para ouvir as batidas de seu coração contra o meu.
Mas se é noite, deixo-os bem abertos
para ver a luz das estrelas no reflexo dos teus olhos.

Nana Pereira

segunda-feira, 6 de julho de 2009

A CEREJEIRA





















A cerejeira de que vos vou falar nasceu numa quinta onde havia diversas árvores de fruto: macieiras, laranjeiras, pessegueiros, pereiras e outras. Era uma árvore muito jovem que dava frutos pela primeira vez. Por isso, estava coberta de flores, o que a deixava muito orgulhosa.

«Como serão as minhas cerejas? – Pensava ela. – Serão grandes? Serão doces? Serão muito vermelhas? Quem as irá colher? Quem as irá provar?».
Com estes pensamentos, ficava a abanar a rama docemente, como a embalar a promessa da chegada dos frutos por ela tão ansiosamente esperados.
- Que linda estás, assim, toda florida! - Disse-lhe, certa manhã, um pardal que viera pousar num dos seus ramos.
- Ah, amigo Pardal, estou tão feliz. Imagina que vou dar frutos pela primeira vez!
- Nesse caso, parabéns! – Exclamou, afectuosamente, a pequena ave.
- Só desejo que os meus frutos sejam muito, muito vermelhos! – Suspirou, esperançada, a jovem cerejeira.
O pardal pôs a cabecinha à banda, admirou os ramos de folhinhas verdes salpicadas de flores, e disse, sincero, a fazer-se convidar:
- Se não te importas, virei visitar-te daqui a mais uns tempos. Como sabes, nós, os pardais, gostamos muito de cerejas…
- Com certeza. Em breve estarei carregadinha de frutos e poderás comê-los à tua vontade! – Ofereceu a cerejeira com igual sinceridade.
A imaginar futuros almoços postos, gentilmente, à sua disposição, o pardal saltitou de um para outro ramo.
- Já alguém te disse que no Japão fazem todos os anos uma grande festa a que dão o nome de Festa das Cerejeiras? – Perguntou ele, que era uma ave culta e gostava de conversar.
Apanhada de surpresa, pois longe estava de supor que num país distante as cerejeiras fossem tão apreciadas, a jovem árvore mostrou-se interessadíssima com a novidade.
- Não, nunca ouvi falar. Mas conta, conta! Quando fazem essa festa?
- Quando as cerejeiras estão cobertas de flores, como tu agora. – Informou o pardal.
- Já lá estiveste? – Perguntou a cerejeira.
- Não. Quem me contou foi uma andorinha minha amiga, muito viajada e que sabe muitas coisas passadas no mundo dos homens. – Explicou o pardal.
Nesta altura, houve um momento de silêncio que ambos aproveitaram: a cerejeira para balouçar ao sabor do vento os ramos floridos; o pardal para esticar as asinhas num jeito de abraço.
- E que mais sabes acerca de cerejeiras? – Quis saber a árvore.
- Sei que as meninas gostam de pendurar nas orelhas a cerejas, a fingirem de brincos…
- E que mais?
- …Que as cerejas servem para fazer doces, geleias e compotas…
- Sim?
- …Que da madeira de cerejeira se fazem delicados trabalhos de marcenaria…
- Sabes muitas coisas, amigo Pardal! – Elogiou a cerejeira perante tão vastos conhecimentos.
O pardal, com ar modesto, agradeceu.
- Bom, mas agora vou andando. Tenho um encontro marcado, ali, na Figueira Grande, com um grupo de pardais meus amigos. Mas eu volto. E não só pelas tuas cerejas. Volto para saber de ti, porque sou teu amigo! – Afirmou antes de levantar voo.


Quando ficou sozinha, a cerejeira pensou de si para si:
«Que bom ter um novo amigo. Quem dera que volte depressa».
Tempo depois, por entre a sua folhagem, começaram a surgir os primeiros frutos. Mas a cerejeira não se mostrou feliz. Pelo contrário! Ao verificar que as cerejas não ofereciam a cor vermelha que tanto desejava, sentiu-se imensamente triste.
«Que pouca sorte a minha. – Lamentava-se ela. – Que frutos tão sem graça os meus, assim, sem cor…Nem o meu amigo Pardal os vai cobiçar por mais fome que tenha!».
O Sol, lá em cima, ia ouvindo os seus queixumes.
«Tem ainda muito que aprender.» - Pensava ele.
Até que um dia, o Sol, condoído com o desgosto da cerejeira, aqueceu os seus raios o mais que pôde, enviou-os para a Terra, e com eles envolveu dias e dias a fio a polpa das cerejas.
Ao reparar que os frutos a pouco e pouco mudavam de cor, a cerejeira encheu-se de alegria. As cerejas, finalmente amadurecidas e muito vermelhas pela acção do Sol, pendiam agora ao longo dos seus ramos, em graciosos cachos, como se fossem meninos a dar a mão.
- Cá estou eu de novo. Mas hoje venho para almoçar! – Ouviu a cerejeira certa vez.
- Olá, amigo Pardal, sê bem-vindo! – Saudou ela muito feliz. – Podes comer à-vontade. O prometido, é devido!
O pardalito debicou um dos frutos.
- Hum…Como são boas. Nunca provei cerejas tão docinhas e vermelhas como as tuas!
Ao escutar estas palavras a cerejeira estremeceu todos os seus ramos numa grande satisfação.
Foi nesta altura que o Sol, lá em cima, piscou um dos seus raios para a Terra com um ar muito maroto!

Soledade Martinho Costa